Carnaval

O UFPA Pesquisa dessa semana vem no clima de Carnaval, trazendo discussões interessantes em torno da festa que é uma das mais populares do Brasil e de sua relação com o campo da ciência. Sempre em pauta, o Carnaval é tema de pesquisas e trabalhos acadêmicos, inclusive na Universidade Federal do Pará. E para saber como são desenvolvidos os trabalhos sobre a temática na UFPA, convidamos Ana Flávia Mendes Sapucahy, professora da UFPA (ICA e PPGArtes) e coordenadora do Grupo de Pesquisa Coreoepistemologias, e Eduardo Wagner Nunes Chagas, professor da Escola de Aplicação da UFPA, carnavalesco e colaborador do Projeto de Pesquisa e Extensão Cartografia Cultural Afro-brasileira.

O primeiro modelo de festejar o Carnaval no Brasil foi o Entrudo, uma verdadeira algazarra trazida pelos colonizadores lusitanos. Haviam dois tipos de Entrudos, um doméstico e um popular, o qual as pessoas se jogavam trigo ou qualquer outro produto que estivesse ao seu alcance (até mesmo urina). A festa desordenada e caótica foi proibida no Rio de Janeiro e em outras regiões do mundo, por conta dos diversos problemas que causava. Com o fim do Entrudo, tentou-se introduzir uma forma mais “disciplinada” de se festejar o Carnaval, com uma influência diretamente francesa, entrando em cena os bailes de carnaval. Depois vieram os ranchos, os blocos, os cordões e os corsos, até chegar nas escolas de samba.

“As manifestações carnavalescas existentes hoje no Brasil são reverberações do que já se tinha desde quando a festa foi introduzida no país. Então, tivemos vários formatos de festejos carnavalescos que, ao longo do tempo, foram se ressignificando, readaptando-se. Nós temos hoje, por exemplo, os Pretinhos do Mangue, no qual todos se sujam com a lama do mangue, e lembra bastante o Entrudo”, explica o professor Eduardo Wagner Chagas. Diferentemente do Entrudo, que tem a rua como lugar ideal para ser realizado, as escolas de samba precisam de uma estrutura organizada para construir seu espetáculo, como o sambódromo.

Um dos assuntos discutidos no programa é a representatividade do Carnaval em Belém do Pará. Para o professor Eduardo Wagner Chagas, o Carnaval na Cidade das Mangueiras é um reflexo do Carnaval do Rio de Janeiro (RJ), mas que agregou valores locais. “No restante do país, em geral, o Carnaval é um reflexo do que aconteceu no Rio de Janeiro, por a cidade ter sido a capital do Brasil por muito tempo. Então, o modelo de Carnaval que temos hoje, tendo as escolas de samba como uma das maiores manifestações de festejo de Carnaval, é um modelo que vem do Rio de Janeiro, ainda no início do século XX, mas que foi se adaptando a regiões diversas do país. Mas, em Belém, como uma representação do Carnaval na Amazônia, há uma significação diferenciada em relação a Rio-São Paulo, por conta do contexto socioeconômico, principalmente”, conta o professor.

Na UFPA, existem grupos de pesquisas que trabalham com a temática do carnaval. Um exemplo é o Grupo de Pesquisa Coreoepistemologias, coordenado pela professora Ana Flávia Mendes Sapucahy, que tem o objetivo de experimentar poéticas em dança na contemporaneidade, buscando a capacidade de reflexão acerca do fazer poético, o que permite um leque de possibilidades. De acordo com a pesquisadora-artista, no grupo há pesquisas voltadas para a improvisação em dança, criação de metodologia para o ensino da dança e experimentação de métodos para criar coreografias.

“Eu me interesso bastante pela abordagem do ensino e criação de dança, não apenas ao que diz respeito ao Carnaval, o qual vem com muita força para o grupo de pesquisa, mas sobre a dança imanente, que é uma proposição de dança aberta a qualquer corpo, qualquer movimento pode vir a ser dança. Esses são os princípios do pensamento sobre dança imanente, atravessados por valores e referências do Carnaval, sobretudo pela dança de Porta-Bandeira e Mestre-Sala”, conta Ana Flávia Mendes Sapucahy.

Com cinco anos de existência, o Projeto Cartografia Cultural Afro-brasileira, da Escola de Aplicação da UFPA, trabalha com o ensino da cultura africana e indígena, de forma multidisciplinar. Professores de qualquer disciplina do ensino médio da instituição criam grupos de estudos com temas específicos, escolhem suas metodologias e apresentam um produto final no Dia da Consciência Negra. De acordo com Eduardo Wagner, o projeto surgiu como atendimento à Lei nº 10.639, que obriga o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas de fundamental e ensino médio, públicas e particulares do país.

“Quando iniciei os trabalhos no primeiro grupo, em 2014, utilizei minhas pesquisas do doutorado em Antropologia sobre as festividades de São Benedito no bairro do Jurunas-Belém. Embora fosse sobre a festividade de São Benedito, o trabalho trouxe o Jurunas, que trouxe o Rancho Não Posso Me Amofiná e logo o Carnaval. Em virtude da aceitação recebida por parte dos alunos, no ano seguinte eu criei um grupo sobre estudos do Carnaval no Brasil e sobre as escolas de samba. A justificativa era como as escolas de samba surgiram a partir de uma influência africana direta dentro da construção da cultura brasileira. Isso fortaleceu ainda mais minha discussão de história da arte dentro de sala de aula, tomando os desfiles de escola de samba como ilustração, como objeto de análise”, explica o professor Eduardo Wagner Chagas.

Apesar de sua relevância social, cultural e econômica, o desfile oficial do Carnaval de Belém este ano foi suspenso em virtude da crise econômica. Os impactos do cancelamento do desfile na Aldeia Amazônica, bem como a representatividade da festa para trabalhadores e comunidades populares da cidade também são assuntos discutidos neste programa.

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