“Novas formas de trabalho, velhas práticas escravistas”
UFPA Pesquisa
Rádio Web UFPA
Novas formas de trabalho, velhas práticas escravistas é o estudo em destaque nesta edição do UFPA Pesquisa. A jornalista Elissandra Batista conversa com a professora Valena Jacob, diretora do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA e coordenadora do grupo de pesquisa Novas formas de trabalho, velhas práticas escravistas.
No dia 13 de maio de 2023, a Lei Áurea, que libertou os negros escravizados e proibiu o trabalho forçado no território nacional, completou 135 anos em vigor no Brasil. No entanto, apesar dos diversos avanços nas relações de trabalho, as velhas práticas coloniais continuam atingindo os brasileiros na contemporaneidade.
De acordo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em 2023, 1.201 trabalhadores foram resgatados de situações análogas à escravidão, em 17 estados brasileiros. 87,3% dos casos foram em propriedades rurais. O estado de Goiás está no topo do ranking com 372 pessoas resgatadas de trabalhos semelhantes à escravidão, entre janeiro e abril, deste ano.
Em segundo lugar, aparece o Rio Grande do Sul, com 296 casos. Número impulsionado por uma operação conjunta das forças de segurança, realizada em fevereiro deste ano, nas bilionárias vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton, localizadas na cidade de Bento Gonçalves, onde 207 trabalhadores viviam em condições desumanas.
Em comparação aos anos anteriores, o total de trabalhadores resgatados em 2023 representa o maior número de ocorrências dos últimos 15 anos, além de uma alta de 140% em relação ao mesmo período de 2022, quando os dados apontam 500 trabalhadores resgatados. Em 2021, foram 430. Mas as estatísticas baixas estão relacionadas ao desmantelamento da estrutura do Estado brasileiro no combate ao trabalho escravo contemporâneo, como destaca, no UFPA Pesquisa, a professora Valena Jacob.
“Sabes quantos trabalhadores nós temos hoje no Pará que foram resgatados?: Cinco resgatados. E o Pará sempre foi o estado que esteve no ranking, será que acabou o trabalho escravo no Pará? De jeito nenhum. Os trabalhadores estão sendo escravizados no interior. O que houve foi uma redução nas fiscalizações com a diminuição da equipe de auditores fiscais, com toda uma política, nos últimos seis anos, de total desaparelhamento da estrutura de fiscalização trabalhista.”
No UFPA Pesquisa, a professora Valena Jacob relembra, ainda, que, em 2016, o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por não prevenir o trabalho escravo moderno. “A Corte determinou que o Estado, de fato, cumpra a lei interna que proíbe o trabalho escravo, julgue e processe com eficácia e rapidez os casos, tanto na área criminal, quanto na trabalhista. E que, além disso, o Brasil aumente o número de fiscalização”.
Entre as diversas situações que causam esse tipo de crime estão a impunidade e o desemprego. Assim, os trabalhadores precisam se submeter a condições degradantes, trabalhando de graça e contraindo dívidas impagáveis, especialmente, com os grandes latifundiários. “O desemprego está maior. Por isso, essas pessoas são facilmente cooptadas pelos aliciadores. E quando são resgatadas recebem as verbas rescisórias, três meses de seguro desemprego e acabou. Se a pessoa não tiver emprego, ela volta para o ciclo da escravidão,” complementa Valena Jacob.
Para dar apoio e assistência jurídica gratuita às vitimas, em 2022, foi criada a Clinica de Combate ao Trabalho Escravo da UFPA. A iniciativa, que envolve ensino, pesquisa e extensão, é uma forma de colocar em prática o papel social dos futuros advogados, juízes e demais promotores de justiça, frente ao combate ao processo de exploração dos trabalhadores. “A gente precisa formar alunos com esse compromisso. E o fato da Universidade ter metade das vagas sendo preenchidas por alunos cotistas já mostra uma diferença tamanha, porque são alunos que conhecem a realidade na pele, na prática.”
Para denunciar trabalho forçado, servidão por dívida, condições degradantes e jornadas exaustivas acesse o site do Ministério Público do Trabalho (MPT) ou Disque 100. E para entender melhor o contexto, a conjuntura e os desafios no combate ao Trabalho Escravo Contemporâneo, no Brasil, não perca esta edição do UFPA Pesquisa.
Apresentação: Elissandra Batista
Produção e roteiro: Denily Carvalho
Gravação e montagem: Denize Ramos e João Nilo
Supervisão e edição: Elissandra Batista
Foto do livro “Retrato Escravo”, de João Roberto Ripper e Sérgio carvalho