“Há um conjunto de circunstâncias que acabaram por desaguar na Reforma Protestante. Desde o século XI havia um mal-estar na alma, mas também um mal-estar expresso materialmente. Havia uma cultura muito intensa, solidificada, de que o novo milênio significaria uma expectativa de ressurreição, de movimento de esperança. O ano mil se realiza e esse fenômeno não acontece. Isso cria, junto com outras determinantes, um vazio espiritual bastante expressivo. Por outro lado, a institucionalidade da Igreja se fortaleceu e ela cristalizou o modo de ver e de experimentar a fé. Esse modo de ver e experimentar a fé foi questionado e não foi aceito de pronto”, conta o professor da UFPA Fernando Arthur de Freitas Neves.
De acordo alguns historiadores, no dia 31 de outubro de 1517 Martinho Lutero pregou na porta da igreja do castelo de Wittenberg, na Alemanha, as 95 teses que abalaram a Igreja Católica e transformaram o cenário religioso e político medieval. A data fatídica foi o marco da Reforma Protestante, que completou quinhentos anos e revolucionou o modo de ver e experimentar o cristianismo. “Também havia uma expressão de poder nessas disputas religiosas. Não era simplesmente uma forma de vivenciar a religião, mas também é como o poder se organiza e se institucionaliza nessas religiões”, complementa Fernando Arthur, que é doutor em História Social e atua com pesquisas em áreas como teorias da história, religião e religiosidade, história da igreja e espiritualidade e secularidade.
Fernando Arthur é um dos convidados desta edição do UFPA Pesquisa sobre os 500 anos da Reforma Protestante. Quem participa também é o professor da Universidade do Estado do Pará, Antônio Carlos Teles, doutor em Teologia e pesquisador na área de Origens do Movimento Ecumênico na Amazônia Paraense. “Nenhum acontecimento histórico acontece do nada. Uma série de circunstâncias, especialmente a partir dos séculos XI e XII, vão se agregando e quando chega no início do século XVI a situação se torna, eu diria, irreversível. Chega-se ao ponto em que alguma coisa tem que acontecer”, comenta o professor Antônio Carlos.
Para ele, o colapso do sistema de produção medieval, a decadência moral e espiritual do clero, a hierarquia da Igreja Católica e as insatisfações dos camponeses contribuíram para a Reforma Protestante. “A eclosão aqui, da necessidade do ser humano começar a ser ouvido, uma guinada antropológica da maneira como o ser humano se percebe. O ser humano começa a ocupar uma posição mais central em termos de referência do que é a vida. Então, essas tendências e esses fatores vão se agregando e chega-se ao início do século XVI com uma crise para a qual tem-se que buscar ou tem que surgir uma solução”, explica o professor Antônio Carlos.
Durante muito tempo, o Clero conseguiu manter o poder religioso e político. A Igreja era portadora de autoridade, tanto terrena quanto espiritual, assumindo o papel de salvaguarda da humanidade. “Porém, a peste no século XIII e a mortandade alcançou um percentual muito alto na sociedade europeia e começa a assolapar esse papel da Igreja, que começa a perder a credibilidade, o caráter de grande protetora. Essa perda da autoridade espiritual, parece-me de certa forma, é compensada pela multiplicação dos artifícios de repressão de toda e qualquer divergência interna”, analisa o professor Antônio.
De acordo com o professor Fernando Arthur, há autores contemporâneos que partilham da dúvida de Lutero, embora não partilhem das soluções apresentadas por ele. “Erasmo de Roterdã também partilhava dessa condição do modo como se expressava a religiosidade, sobretudo como ela era dirigida por uma Igreja completamente apartada de qualquer outra noção que não a sua própria. Ou seja, ela não era capaz de perceber nem de captar as experiências de religiosidade, que tinha a ver com a nação ainda em nascimento, com as necessidades mais urgentes, com as condições de vida apresentadas naquele instante. Foram elementos importantes para se desvencilhar dessa autoridade da Igreja, que o Antônio Carlos já se referiu”, complementa o professor.
Para saber mais como se iniciou a Reforma Protestante, quais as principais figuras desse importante movimento histórico e interessantes discussões sobre o assunto, não perca esta edição do UFPA Pesquisa.
Texto: Hojo Rodrigues
Apresentação: Fabrício Quieroz
Produção e roteiro: Ryan Graves
Gravação e Montagem: João Nilo Ferreira
Supervisão e Edição: Elissandra Batista e Fabrício Queiroz.
O UFPA Pesquisa vai aos ar todas as quinta-feiras, às 10h e 21h.
Horários Alternativos: sexta-feira, às 15h / domingo, às 10h.